GAMELEIRA: a história de Itabuna passa por aqui!

“A praça! A praça é do povo
Como o céu é do condor”.

(Castro Alves)

O transeunte desavisado não imagina que, em sua rápida travessia pela atual praça José Bastos, esteja pisando terreno tão importante para a história itabunense.

A primeira denominação do lugar, “Gameleira”, provavelmente tenha decorrido da existência de árvore dessa espécie remanescente da mata ali reinante até a chegada dos primeiros desbravadores.

Aproveitando a topografia do lugar e a qualidade da água existente no adjacente ribeirão Lava-pés (hoje esgoto canalizado), o terreno foi aproveitado por Constantino Grego (abatedor de gado e comerciante de carne) para pastarias que confinariam a preciosa boiada proveniente do Sertão da Ressaca, Felícia ou das Minas Gerais.

Naquele espaço, não é novo o intenso deslocamento de pessoas, vem de longas datas. Todo viajante (fazendeiro, peão ou mascate) proveniente das bandas de Água Branca, Pau-caído, Sequeiro do Espinho, Catolé, Rio do Braço, Mutuns e Oiteiro da Palha por ali passava quando se dirigia a Taboca Grande ou a Taboquinhas. O largo também servia como limite entre o arraial e o seu primeiro bairro, o “Arrabalde da Misericórdia”, atual “Pontalzinho”.

Constantino Grego fez parte dos pioneiros da terra, pois chegou em Tabocas bem no início, quando ainda era um arruado, quase no mesmo período de José Firmino Alves e Macário Aurélio dos Reis. Visionário, escolheu o local da atual praça José Bastos e adjacências para explorar o comércio de carne bovina. O primeiro matadouro da futura Itabuna foi ali estabelecido. Tempos depois, quando o arraial cresceu e alcançou a independência política, aquele largo foi desapropriado à revelia do primeiro donatário (há quem diga que o espaço foi apropriado por um antigo chefe do executivo, com a justificativa de que a ação seria necessária, tendo em vista a evolução, proeminência e crescimento da urbe).

Pelos trilhos da estrada de ferro a modernidade chegou a Tabocas, e nas outrora pastarias dos Gregos foi instalada a Estação do Trem. O topônimo “Gameleira” começou a ser esquecido, e o  largo passou a ser lembrado como “Praça da Estação”. Não demorou muito e a locomotiva deu as caras, inicialmente no ano de 1911 em viagem experimental, depois, a partir de 1913, já atuando comercialmente para transportar cargas e pessoas. Assim, o constante ir e vir tornou-se comum, e aquele burburinho passou a fazer parte da vida da cidade por décadas. A partir daí os apitos da Maria Fumaça começaram a ditar ordens e normas. Encontros, reuniões, abertura ou fechamento do comércio, início de aulas e um sem-número de atividades urbanas obedeciam ao estridente e inconfundível “piuí”. A efervescência ferroviária (apogeu e declínio) durou cinco décadas.

Por meio de resolução municipal, em 1930, resolveu-se nominar o espaço público “praça João Pessoa”, em homenagem ao político paraibano recém-assassinado.

A leste do logradouro ainda subsiste um robusto edifício, testemunha de boa parte das transformações locais, em cuja fachada superior encontra-se gravado em relevo “Instituto de Cacau da Bahia” (ICB), uma indicação de que o outrora importante órgão já encontrara guarida em suas dependências. Não somente o ICB. O levantamento do prédio deu-se há décadas para receber a elegante casa de espetáculos, o “Cine Ideal”. Depois, vários outros empreendimentos peregrinaram por ali: a Matriz de São José, o quartel da polícia, um clube de dança, um cabaré, o próprio ICB e, mais recentemente, a “Cesta do Povo”. Ainda hoje, o vetusto imóvel continua a apreciar a buliçosa vida central itabunense à espera de alguém que lhe dê um novo destino, quiçá útil e à altura de sua história.

Em 1960, nova alteração de nome, o qual persiste até hoje: praça “José Bastos”. Uma justa homenagem ao notável poeta grapiúna, nascido no arruado de Água Branca (atual bairro do Antique), que tão prematuramente deixou sua terra natal. Nessa mesma década a municipalidade transferiu para os arredores do largo o “Serviço Especial de Saúde Pública” – SESP, cujo edifício é ora ocupado pela “Unidade Básica de Saúde José Maria Magalhães Neto”.

Os poderes municipais também ali já tiveram suas casas. O executivo, representado pela Prefeitura, e o legislativo, compreendido pela Câmara de Vereadores, ambas alojadas em 1976, quando o prefeito José Oduque Teixeira inaugurou o Centro Administrativo; e o judiciário (Fórum Ruy Barbosa), que ali atendeu aos jurisdicionados até recentemente. Acrescente-se ainda, principalmente para aqueles que entendem ser a “mídia” um quarto poder, que também estiveram instalados nas cercanias da praça a “Radio Jornal” e o “Diário de Itabuna”.

Ali também funcionou a segunda grande feira livre itabunense, no período que vai dos anos 40 até 1972, quando, por decreto municipal, foi transferida para o Centro Comercial de Itabuna. Também nas adjacências quase tivemos um centro popular de compras, o natimorto “Shopping dos Camelôs”.

Somente as memórias e as ações registradas, fixadas e desenroladas na praça/largo Gameleira/da Estação/João Pessoa/José Bastos dariam para, agregadas e formalizadas, compor um belo livro da história local.

* Clóvis Silveira Góis Júnior é servidor público federal, com formação em Administração e História, responsável pelo perfil @historia.grapiuna (instagram) e autor dos livros “A Gênese do Adventismo Grapiúna” e “Sequeiro do Espinho: passos de um conflito”.

http://www.a5editora.com.br/Livro/sequeiro-do-espinho—passos-de-um-conflito