Segundo Eduardo Benones (MPF-RJ), senador teve a intenção de não faltar a acareação com Paulo Marinho, na segunda-feira. No mesmo horário, Flávio Bolsonaro estava em programa de TV em Manaus. Defesa diz que ‘tese de crime de desobediência’ é ‘lamentável’.
O procurador Eduardo Benones, do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, enviou uma representação nesta terça-feira (22) contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) na Procuradoria-Geral da República.
O procurador alega que Flávio tentou atrapalhar a investigação do suposto vazamento da Operação Furna da Onça e pede que a PGR investigue se houve crime de desobediência.
Segundo o documento enviado à PGR, Flávio Bolsonaro teve a intenção de não comparecer, na segunda-feira (21), a uma acareação marcada com o empresário Paulo Marinho.
O procurador-geral da República, Augusto Aras, vai decidir se abre ou não investigação.
Em nota enviada na segunda-feira, a defesa de Flávio diz que “é lamentável sob vários aspectos” a tese de desobediência. “Nem o procurador da República poderia dar ordem ao Senador e nem essa ‘ordem’ seria legal, pelo que constituiria uma impropriedade técnica com poucos precedentes na história do Judiciário Fluminense” (veja a íntegra no fim da reportagem).
O suposto vazamento
Um dos principais aliados do presidente Jair Bolsonaro na campanha eleitoral de 2018, Marinho disse ao jornal “Folha de S.Paulo” que Flávio Bolsonaro, filho do presidente, foi avisado com antecedência por um delegado da Polícia Federal sobre a deflagração da operação. O senador nega. O MPF quer colocar os dois frente a frente porque acredita que um dos dois mentiu.
Flávio Bolsonaro não era investigado na Furna da Onça, mas foi na operação que apareceu um relatório de inteligência do antigo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sobre uma movimentação financeira suspeita de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio. O relatório acabou sendo usado pela investigação da “rachadinha”.
Em depoimento, Paulo Marinho disse que o vazamento da operação teria provocado, em outubro de 2018, a exoneração de Queiroz do gabinete de Flávio e da filha dele, que era lotada no gabinete de Jair Bolsonaro na Câmara dos Deputados. Eles negam.
“Sendo certo que ninguém pode se eximir da obrigação legal a todos imposta de colaborar com as investigações criminais”, escreveu o procurador em seu parecer.
Ainda segundo Benones, houve “imposição de óbices e condições legalmente injustificadas para realização de ato investigatório de acareação”.
O senador alegou motivos de “agenda oficial” para não comparecer e entrou com uma petição, na segunda-feira, para que acareação fosse marcada para o início de outubro.
No horário previsto para a acareação, Flávio Bolsonaro postou uma foto com um apresentador de TV em Manaus. Um vídeo publicado nas redes sociais mostra ele, o irmão e deputado federal Eduardo Bolsonaro e a equipe do programa cantando em coro uma música crítica a “maconheiros” (veja na reportagem acima).
Flavio Bolsonaro pediu ainda para depor no gabinete dele, no Senado, sem filmagem, mas o procurador também negou.
Sobre a acareação no gabinete, Benones disse que rejeitou o pedido para “evitar que o local de realização do ato se torne, por si só, um elemento anímico autônomo de intimidação e coação, que pode comprometer os objetivos primordiais de esclarecimento dos fatos”.
Ele afirmou que não fazer o registro em vídeo da acareação, outro pedido, é algo que não caberia ao senador decidir.
Entenda as implicações jurídicas do não comparecimento de Flávio Bolsonaro à acareação
Senador quis faltar por motivo de saúde
O senador já havia tentado faltar por motivos de saúde, sem apresentar atestado médico e mesmo curado da Covid-19 duas semanas antes da acareação.
A TV Globo teve acesso ao despacho do procurador do caso, Eduardo Benones, que rejeitou o pedido de Flávio Bolsonaro para faltar à acareação.
No documento, de 3 de setembro, o procurador reproduz o pedido de Flávio Bolsonaro: “Que a data de 21/09/2020, com comparecimento presencial, na sede do Ministério Público Federal do Rio de Janeiro, seria temerária em razão de o requerente ter contraído infecção pelo Sars-CoV-2; em virtude da prerrogativa prevista no artigo 221 do Código de Processo Penal para os senadores, estaria impedido de tomar parte na acareação, a fim de que a saúde dos circunstantes fosse resguardada”.
Em 6 de setembro, 14 dias antes da acareação, Flávio Bolsonaro anunciou em redes sociais que estava curado da Covid-19, doença transmitida pelo novo coronavírus.
O procurador recusou o pedido e justificou: “Admitir a não realização de ato investigatório futuro sob a mera alegação de impossibilidade de comparecimento por motivo de saúde não contemporânea seria perfilhar a prevaricação”.
Por Arthur Guimarães e Camila Bomfim, G1 Rio e TV Globo. Foto: CNN Brasil