Por Walmir Rosário*
Na década de 50 do século passado, os estudantes baianos tomaram conta – de cabo a rabo – da União Nacional dos Estudantes (UNE). Dentre eles, muitos itabunenses participavam da diretoria ou exerciam forte liderança entre a estudantada brasileira, a exemplo de Gutemberg Amazonas, Gervásio José dos Santos, Laércio Pinho Lima e Dagoberto Brandão.
Formados, com o canudo nas mãos, cada retornou a Itabuna para seguir sua profissão escolhida. Gervásio José dos Santos implantou uma forte banca de advogado; Gutemberg e Dagoberto suas empresas de engenharia civil; e Laércio Pinho um escritório de consultoria em economia, prestando serviços às empresas privadas e órgãos públicos, àquela época ainda uma novidade no interior.
Diplomado pela conceituada Faculdade de Economia da Universidade Presbiteriana Mackenzie, em São Paulo, considerada um centro de excelência no ensino superior, Laércio chega a Itabuna resolvido a realizar profundas transformações na cidade, tirá-la de sua condição de cidade do interior (apesar de rica) e dotá-la de todos os requisitos de uma verdadeira metrópole. Um sonho ousado. Como ele.
Em Itabuna cada um com sua profissão e a política fervendo nas veias, tal e qual acontecia nos tempos do Colégio Central, em Salvador, e nos cursos universitários, dirigindo grêmios estudantis, centros acadêmicos e diretórios centrais. E esse caminho trilhado por eles na academia e continuou fielmente após a formatura, cada um militando no seu partido político.
Em Itabuna, ao reencontrar o amigo Dagoberto Brandão, também recém-formado e disposto a aplicar todos os ensinamentos aprendidos na Escola Politécnica, Laércio foi enfático e decisivo ao propor a elaboração de um grande projeto. Monumental, seria a palavra mais adequada para adjetivar aquele calhamaço de papéis com textos e cálculos matemáticos e estatísticos. Sem delongas, propôs ao amigo:
– Dagô, vamos revolucionar a capital do cacau, vamos tornar Itabuna uma cidade de primeiro mundo. De acordo com meus estudos transpostos para o papel, basta você elaborar um projeto contendo duas lâminas verticais, cada uma delas, e dotada de todas as modalidades de comércio e habitação com capacidade para abrigar 30 mil pessoas – encomendou ao amigo Dagoberto.
Após se debruçar sobre os estudos do economista Laércio Pinho, o astucioso Dagô desconfiou da viabilidade do projeto para uma cidade ainda provinciana como Itabuna, que àquela época possuía uma população de pouco mais de 60 mil almas. Desconversou e ficou o dito pelo não dito. Pouco tempo depois, Laércio muda-se para São Paulo, onde foi trabalhar em grandes empresas e grandes projetos, e não se falou mais nisso.
Por sua vez, Dagoberto também muda-se para Salvador, após aprovação num concurso da Petrobras, aparecendo em Itabuna apenas para rever os familiares e promover algumas farras com os amigos. Em Salvador, Dagô se transformou no embaixador e anfitrião dos itabunenses, até voltar a Itabuna, demitido que foi da petroleira, por motivos políticos, e retoma sua vida.
Anos depois, Laércio Pinho Lima, um cavalheiro, na mais fina acepção da palavra, também retorna ao Sul da Bahia para assumir cargos nas áreas de planejamento nas prefeituras de Itabuna e Ilhéus. Embora Itabuna tivesse se tornado uma cidade já bem desenvolvida, os dois amigos não tocaram mais no assunto do monumental projeto, a não ser em mesa de bar com gostosas gargalhadas.
E o local escolhido para abrigar o tal empreendimento era a confluência do bairro do Banco Raso, onde anos depois foi construído um conjunto habitacional do BNH, que abrigou milhares de pessoas. Não na quantidade e qualidade conforme os desejos do economista Laércio Pinho Lima, que agora tratava do planejamento de cidades, tal e qual laborou na chamada Califórnia Paulista.
Até o fim de sua vida, Laércio revelava, por A + B, que Itabuna teria perdido uma oportunidade de se rivalizar com as maiores cidades da Bahia, caso seu projeto tivesse sido concretizado. Naquela época, esse tipo de equipamento urbano passou a ser uma realidade nos Estados Unidos e outros países do hemisfério norte – final dos anos 60 e início de 70 – sendo um misto de conjunto habitacional e shopping center vertical.
Fora esse projeto, o economista Laércio Pinho Lima foi planejador, empresário do ramo da construção civil, professor de Economia da Uesc e exerceu diversos cargos de confiança em órgãos públicos, entre eles as prefeituras de Itabuna (governo Ubaldo Dantas) e Ilhéus (governo Antônio Olímpio), nas quais elaborou grandes projetos. Muitos dos quais deram base para o crescimento e, quem sabe, desenvolvimento das duas cidades.
Laércio Pinho era um grande visualista e idealista incorrigível, capaz de colocar no papel seus grandes sonhos.
*Radialista, jornalista e advogado