O fechamento da Ford trouxe-me memórias interessantes

Por Fábio Fagundes

Não pude me conter em escrever esse texto.

Ao entrar na faculdade em 2000 (USP/Engenharia) tinha um gigante painel de oportunidades de trabalho, na qual muitas da Ford em Camaçari. Não existia trainee direito, era algo como 6 meses de estágio e virava gerente de alguma coisa. Era meu sonho, na época, já que tinha saído da Bahia e ido para São Paulo estudar, e já de cara ver isso. Foi empolgante.

Quando me formei (2005) esse mesmo painel era uma fração do que era. Curiosamente a partir de 2000 a China acelerou muito seu crescimento num ritmo maior do que já vinha desde 1980. As oportunidades já não eram as mesmas.

Meu primeiro emprego foi na Visteon (Guarulhos), que fabricava na época painéis dos carros da Ford. Logo nos primeiros dias um engenheiro de projetos sênior chegava indignado. Ele comprou um carrinho simples de plástico de presente para seu filho no shopping. O preço que ele pagou no shopping era menor que o custo de fabricação no Brasil, segundo ele. O pouco que fiquei na Visteon vivi a tensão da emergente China, tudo de lá era melhor e mais barato.

Em seguida fui para a Alemanha e lá a meta era automatizar e automatizar. Robô para tudo que é lado. Os chineses estavam chegando!

Os anos se passaram, sai da indústria automobilística, fui para TI e depois varejo por conta da família.

A Alemanha fez muitas reformas trabalhistas, criou secretarias para combater crises, Schwarze Null (zero déficit fiscal), e reforma atrás de reforma, mais importante, com apoio dos sindicatos.

Durante mestrado (FGV/Adm/2017) foi uma oportunidade de rever as coisas por um ângulo ainda melhor. Não só pelos professores, mas também pela vivência com colegas de classe. Um dele falou que a Visteon que trabalhei não passava de uma fração do que era na minha época.

Um dos módulos do mestrado foi na China, onde vi de perto a realidade. Empregos de sobra, economia pulsante, 800 milhões saíram da pobreza. Cadê o socialismo divulgado pela mídia tradicional? Não existia. Mas sim um capitalismo voraz. Enquanto na China sobravam vagas de altos cargos, aqui no Brasil meus colegas perdiam seus altos cargos. Vi americanos da minha turma e de grandes universidades procurando empregos na China. Sim, a China já pega mais que os EUA em muitos cargos.

Sai do mestrado com a certeza de que a culpa do Brasil estar assim é nossa. Com uma CLT imposta há 77 anos por um ditador ainda sobrevive a vários congressos eleitos democraticamente?

Nossa sociedade com o senso de protecionismo excessivo, ideologismo, sei lá mais o que.
E como a vida dá voltas, um dos conhecidos de colégio aqui de Itabuna é um dos líderes do PT na Bahia. Há algumas semanas ele celebrava “XX anos da Revolução Cubana”. Hoje ele está preocupado. A principal fonte de renda da família dele é um Pet Shop, em Camaçari.

Enquanto os alemães propuseram reformas através dos sindicatos, aqui andamos com camisetas de Che Guevara.

Cada um segundo suas obras.