Assistimos nos últimos dias um julgamento no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que determinou a cassação de vereadores eleitos pelo partido Cidadania, em Itaiçaba (CE), em virtude de fraude do diretório na cota de gênero nas eleições municipais de 2020. Não é nenhuma novidade termos julgamentos na Justiça Eleitoral, em virtude da utilização de candidaturas femininas para interesses partidários masculinos, assim como, não é nenhuma novidade fundamentações em decisões judiciais impregnadas de machismo, o que dificulta a isonomia de direitos às mulheres.
“Eu acho que devemos ter uma empatia com as mulheres candidatas”. Esta frase é do Ministro Cassio Nunes, a qual representa bem o machismo com tonalidades de moderação.
Com um olhar desatento, poder-se-ia achar o Ministro Cássio Nunes um “fofo”, ou aquele que consegue sentir um afeto capaz de dimensionar a opressão feminina secular.
Mas trata-se do velho e ao mesmo tempo tão atual, afeto patriarcal, que subtrai a liberdade e autonomia das mulheres. Não é de empatia que as mulheres necessitam, mas sim de liberdade, educação e exercício cívico, que possam proporcionar o alcance e permanência das mulheres nos espaços de poder, sem a representação e auxílio de qualquer tutor ou administrador de suas vidas.
Senhor Ministro, seu afeto e seu reconhecimento não derrubam anos de opressão feminina que priva a igualdade das mulheres nos espaços públicos e privados, o que resulta em todas as formas de violências suportadas diariamente, sobretudo pelas mulheres negras.
A singela e afetuosa fala do Ministro Cássio Nunes não é nenhum exercício político e judicial que possa colaborar com o rompimento das estruturas patriarcais, mas ao contrário sua fundamentação judicial mantém a lógica do cuidado patriarcal que governa e subtrai a autonomia feminina.
Frequentar escola, acesso às faculdades, filiar-se a partidos políticos, votar, se divorciar, ter cartão de crédito, jogar futebol, criação de DEAMs, igualdade de direitos constitucionais, lei do feminicídio e importunação sexual, foram direitos conquistados lentamente com séculos privações e sangue de muitas mulheres. Toda esta dor secular não é em busca de um afeto masculino, mas sim de liberdade e autonomia para fazer suas escolhas e exercícios sociais, profissionais e ideológicas.
Ao menos por hora, tivemos uma mulher, ministra Carmem Lúcia que dissesse algo que eles (homens) já sabem, mas por ocuparem hegemonicamente os espaços de decisões, não admitem materializar a necessária isonomia de direitos previsto na nossa Constituição Federal, apenas manifestam empatia.
Vale apena terminar esta crônica apropriando das precisas palavra da Ministra do STF Carmem Lucia:
“Nós, mulheres, sabemos o que é ser tratada em desvalor. Não é desvalorizando e achando que mulheres são coitadas, porque não somos. Somos pessoas autônomas, em condições iguais a dos homens e, por isso, quando se fala que o partido abandonou, como outrora se diz, porque o marido abandonou a coitada. Não tem coitada, não. Nós não queremos ser coitadas, queremos ser cidadãs”.