Walmir Rosário*
O futebol de Itabuna brilha nos campos e estádios desde 1910, com a criação das duas primeiras equipes: o União Brasil e o Guarani Esporte Clube, dentre outros que vieram posteriormente e recebiam os nomes de Ruy Barbosa, Castro Alves, e até Princesa Isabel. Na década de 50, com a implantação da Rádio Clube de Itabuna (1956), passamos a idolatrar – também – os narradores e repórteres esportivos que cobriam as transmissões.
Um desses craques do microfone era Geraldo Borges Santos, que começou a narrar partidas de futebol ainda nos seus 16 para 17 anos, na Rádio Clube de Itabuna, como qualquer gente grande. E não era pra menos, treinou bastante nas partidas de futebol de botão e se inspirou nos grandes locutores esportivos daquela época, do Rio de Janeiro, Salvador ou Ilhéus.
Em pouco tempo Geraldo Santos já narrava partidas com estilo próprio, sem firulas, preocupando-se em apresentar os jogos sem tirar nem pôr em cada lance, imprimindo a emoção da partida aos torcedores. E tinha que ser assim mesmo, pois no Campo da Desportiva grande parte dos espectadores tinham seus radiozinhos de pilha colados ao ouvido. Era preciso ser fiel, porém com a necessária empolgação.
Narrar uma partida de futebol no interior e por uma emissora do interior não era nada fácil, tendo em vista que os equipamentos eram rudimentares. Uma maleta bem pesada, microfones de externa e gravadores monstruosos, todos ligados ao estúdio por simples arames. Ainda nos anos 1960, a Rádio Clube fazia suas transmissões externas em clubes, praças e estádio com esses equipamentos. Eu mesmo ajudei muito a “puxar o arame” com Eliezer Ribeiro (Corpinho de Leão) e Antônio Luz.
Muito comum àquela época era a transmissão de futebol realizada por duas emissoras, com os profissionais trabalhando em equipe. Uma dessas foi o primeiro teste para o jovem locutor, que transmitiu uma partida entre Bahia e Santos, dividindo o microfone com Fernando Costa Lino e Armando Oliveira (ambos, ainda, na Rádio Cultura de Ilhéus), já considerados “monstros sagrados” do rádio esportivo.
Num determinado momento em que narrou “um cochilo” da defesa do Bahia, ao passar a palavra para Armando Oliveira, levou o maior susto ao ouvir “Não foi um Cochilo, Geraldo Santos”. Na hora ele ficou gelado esperando a explicação, quando Armando conclui seu raciocínio: “Isso não foi um cochilo e sim um sono profundo da zaga do Bahia”… E aí o garoto narrador ganhou mais confiança em sua carreira.
Outro teste de fogo na carreira de Geraldo Santos foi em 1961, quando escalado para transmitir pela ousada Rádio Clube de Itabuna, outra partida entre o Santos e o Bahia, desta vez na Fonte Nova, com Pelé e tudo. Àquela época, as transmissões entre cidades eram feitas através da Radional, que fornecia a linha de ondas curtas até o estúdio da emissora, que a transformava em ondas médias para os ouvintes.
Primeira vez na Fonte Nova, na capital do estado, chega ao estádio com seu técnico de som, Francisco Alves, ligam a maleta e aguardam o técnico da Radional efetuar a ligação com o sistema. Processo realizado, ouve do técnico: “Já está ligado, na hora de ir ao ar, basta pedir a vez ao seu estúdio”. Só que ele não tinha o retorno da emissora em Itabuna e a solução foi entrar no ar dizendo: “Vou contar até dez e inicio a transmissão”.
E assim transmitiu os mais de 90 minutos, sem saber se estava ou não no ar, confirmação que teve dois dias após, quando desceu do avião em Itabuna e recebeu os parabéns pela atuação. E Geraldo ainda guarda o balanço daquela brilhante partida em sua estreia na Fonte Nova, em 22 de dezembro de 1961, empate de 1×1, com gols de Coutinho (Santos) aos dois minutos de jogo e de Mário (Bahia) aos 49 minutos.
Em sua estreia na capital baiana, a partida bateu recorde de renda no Nordeste, com Cr$ 7.441.400,00, para um público de 41.893 pagantes. Conforme a súmula, o jogo foi apitado por Olten Aires de Abreu e o Bahia jogou com Nadinho, Hélio, Henrique e Florisvaldo; Vicente e Pinguela (Antoninho); Nilsinho, Alencar, Didico, Mário e Marito. O Santos com Laércio, Lima, Mauro e Dalmo; Calvet e Zito; Dorval, Tite (Mengálvio), Coutinho, Pelé e Pepe.
Enquanto estudava e trabalhava, Geraldo continuou a narrar os jogos amadores e partidas amistosas com times das capitais e os brilhantes campeonatos intermunicipais conquistados seguidamente pela Seleção de Itabuna. A cada campeonato conquistado pela Seleção, maior o conceito de Geraldo Santos, o garoto que narrava os lances desses jogadores transmitindo toda a emoção da partida.
E a participação daquele garoto na transmissão de partida tão importante chamou a atenção dos esportistas soteropolitanos. Propostas tentadoras não faltaram, porém Geraldo preferiu ficar no rádio itabunense, já que também cursava economia e era funcionário da Ceplac. Até hoje acredita que sua decisão foi acertada, por continuar radialista e seguir promissoras carreiras: acadêmica (professor universitário da Uesc, com mestrado na Fundação Getúlio Vargas) e profissional (exercendo cargos de chefia na Ceplac, procurador jurídico de Itabuna a advogado).
Se a torcida elegia seus ídolos nas quatro linhas, o mesmo acontecia com os narradores, considerados craques do rádio esportivo. Um exemplo foi a transmissão do jogo final do hexacampeonato, em 30 de janeiro de 1966, disputado em Alagoinhas. A transmissão da partida foi realizada em parceria entre a Rádio Clube de Itabuna e a Rádio Emissora de Alagoinhas.
Na transmissão mais esperada pela torcida itabunense, novamente a tecnologia da época tentou – sem êxito – obscurecer o brilho da vitória. E o motivo era bem simples: a energia em Alagoinhas era de 50 ciclos, enquanto Itabuna já operava com 60 ciclos, o que fazia a voz do locutor ficar numa velocidade diferente da normal, mas que não tirou emoção do torcedor ao ouvir Geraldo Santos narrar o Gol de Pinga, que deu o hexacampeonato à Seleção de Itabuna. Foi um delírio geral!
Em seguida, Geraldo Santos e equipe se transfere para a Rádio Jornal de Itabuna e anos depois se despede do rádio grapiúna. Tempos depois apresentou jornais da TV Santa Cruz, em Itabuna. Em sua passagem pelo microfone esportivo descobriu grandes radialistas, a exemplo do seu irmão José Roberto, Ramiro Aquino, Genildo Lawinscky, dentre tantos outros. Atualmente Geraldo Santos Borges se dedica à família e à advocacia.
*Radialista, Jornalista e advogado