Esses dias, ao remexer um HD externo em busca de fotos antigas, me deparei com um arquivo a mim enviado por saudoso Tyrone Perrucho, sobre um daqueles casos inusitados e que somente acontecem uma vez de 100 em 100 anos. Imediatamente, me veio à memória o fato acontecido com um casal amigo, Edmundo e Marinalva, que teria deixado o jornalista aposentado em polvorosa.
Com voz agoniada, Tyrone Perrucho foi logo me avisando: Rosário, aconteceu uma verdadeira tragédia, daquelas que só em Canavieiras acontece. É o fim do mundo, dizia agitado. Enquanto eu tentava acalmá-lo, curioso que também fiquei, e ele foi determinante:
– Isso não é assunto para se falar ao telefone, venha imediatamente aqui no Bar Laranjeiras (de Bené), onde me encontro ainda em choque e quero dividir esse assunto sério com você –.
Mais que depressa rumei para o bar e ele passou a me contar o ocorrido, que se encontra narrado aqui embaixo, sem tirar nem por, conforme assinado pelo verdadeiro autor. É certo que Tyrone Perrucho partiu sem se despedir, mas a história contada por ele ficou registrada.
Por Tyrone Perrucho*
No centro de Canavieiras, onde a avenida Rio Branco encontra-se com a rua São Francisco, dois carros colidem sem maiores danos para seus ocupantes, mas registrando-se alguns prejuízos materiais. Por si só, dois carros baterem na área central da cidade, em uma manhã de pleno sol, é garantia de aglomeração imediata.
No presente caso, o acidente atraiu gente que estava no quiosque Cabanita, na Mercearia do Cawboy, na Pizzaria Com Sabor, no Instituto Panzini, na Academia Universo do Esporte… Os veículos avariados ficaram atravessados no citado cruzamento e logo foram cercados pela multidão. O interesse geral dos curiosos era prestar algum socorro e identificar os acidentados.
Estes, meio tontos com o impacto da batida, desembarcavam já tendo na ponta da língua, naturalmente, o tradicional “a culpa não foi minha”. Eis que do utilitário Dakar creme placa …8985, desce a professora Marinalva Mello, e do Fiat Linea branco placa …2909 (as letras das placas foram omitidas para permitir a privacidade do casal), salta o servidor público aposentado Edmundo Mello.
Foi quando os dois, ainda transtornados com o susto e em meio ao povaréu, travam o seguinte e surpreendente diálogo:
– É você, Edmundo?
– Eu mesmo, Marinalva, ao vivo e em cores… e bem vivo!
Há 40 anos Edmundo e Marinalva se encontram diariamente, mas nunca antes e em tempo algum em situação crítica como aquela. Eles são marido e mulher, casados desde os fins da década de 1970. Edmundo foi funcionário da Ceplac por mais de 30 anos. Trabalhou em Canavieiras, Itabuna e Teixeira de Freitas, onde era, por vários anos, supervisor administrativo dos escritórios de Mucuri, Prado, Medeiros Neto e Lajedão, além de Teixeira de Freitas.
Marinalva, também aposentada, é professora que lecionou em colégios públicos e privados de Teixeira de Freitas e Canavieiras. Ela é membro da nossa Academia de Letras e Artes e dirige a Viver, ONG que estimula a leitura e outras ações sociais entre jovens do bairro Burundanga.
Há cerca de 15 anos os dois vivem num aprazível sítio à beira-mar, o Santa Adelaide, situado na ilha de Atalaia, onde cuidam de plantas e pássaros. Aí costumam acolher os filhos e netos em férias, que continuam vivendo em Teixeira de Freitas. De vez em quando, recebem aí alguns casais amigos.
Mas voltando ao brusco encontro motorizado de marido e mulher, trata-se, é claro, de um fato verdadeiramente surpreendente, que tem tudo para ganhar aquele velho selo de “O impossível acontece”. Sobre o inusitado acidente, soube-se que o jogo do bicho naquele dia “cotou” os milhares 8985 e 2909, porque foi imensa a quantidade de pessoas que fez sua fezinha nos tais números, na supramencionada data. E um derradeiro registro ainda sobre o inesperado encontro do casal: entre tantas pessoas que acorreram para prestar assistência aos acidentados, estavam pelo menos uma autoridade e um compadre do casal.
A autoridade foi o vereador Tiago Medrado, que na qualidade de oposicionista do atual governo, não perdeu tempo para criticar a falta de semáforos nos cruzamentos centrais. O compadre presente foi o técnico em agropecuária, o ceplaqueano Biriri, que respirou aliviado ao constatar que o compadre e a comadre estavam sãos e salvos, mas até hoje se queixa pelos 10 reais que perdeu no bicho.
* Jornalista devidamente aposentado