Bahia é 3º estado do Brasil que mais matou mulheres trans e travestis em 2020

A Bahia é o terceiro estado do Brasil com maior registro de assassinato de mulheres transexuais e travestis em 2020. O relatório é da Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), que alerta anualmente para o crescimento das mortes violentas da população trans do país.

Comparando com 2019, quando oito mulheres trans morreram por causa da violência na Bahia, no ano passado foram 19 trans assassinadas – um aumento de 137,5%. No ano passado, a Antra não registrou assassinatos de homens trans.

O levantamento da Antra é feito de forma quantitativa, porque o Brasil não produz dados demográficos a respeito da população trans. Atrás de São Paulo e Ceará, o estado baiano já figurou o segundo lugar em dois anos consecutivos: 2017 (17 assassinatos) e 2018 (15).

De modo geral, a maioria das vítimas mortas estão no Nordeste: 43% delas. O percentual é seguido pelo Sudeste (34%); Sul (8%); Centro Oeste e Norte, (ambas regiões com 7%). Nacionalmente, a idade média de trans assassinadas é de 29,5 anos.

A maioria das trans vítimas de assassinato em 2020 tinha entre 15 e 29 anos: 56% delas, o que indica a morte prematura de jovens. Em 28,4% dos registros, as idades variavam entre 30 e 39 anos.

Trans com idades entre 40 e 49 anos representam 7,3% das mortas, percentual que sobe para 8,3% no caso das vítimas entre 50 e 59 anos. A Antra não encontrou casos de pessoas trans, com mais de 60 anos, assassinadas em 2020.

O perfil das vítimas é essencialmente o mesmo: mulheres trans e travestis negras, prostitutas, mortas na rua por desconhecidos.

Para fazer o levantamento, a Antra parte de pesquisas em reportagens, que são feitas diária e manualmente. Além disso, há casos que são registrados por instituições de defesa e apoio da população LGBT.

Apesar do crescimento substancial, os dados não refletem uma realidade exata, por causa da subnotificação das mortes de trans e travestis.

Denúncias e falta de dados

Um dos casos que exemplificam essa subnotificação é o de uma travesti assassinada a tiros aos 44 em Vitória da Conquista, no sudoeste da Bahia, em outubro. O crime aconteceu durante uma madrugada, no bairro Sumaré.

A vítima só foi reconhecida como travesti após repercussão da notícia por moradores da cidade, que informaram a identidade de gênero à mídia. Até a última atualização desta reportagem, ela não teve nome social divulgado pela polícia.

Após oito meses do caso, a delegacia ainda não concluiu a autoria e motivação para o crime. Por meio de nota, a Polícia Civil informou que testemunhas foram ouvidas e laudos analisados, mas ninguém foi preso.

Caso semelhante aconteceu na capital, há um ano. Uma travesti também foi morta a tiros na Avenida Octávio Mangabeira, em frente a um estabelecimento comercial.

Apesar do inquérito ter sido concluído e encaminhado ao Ministério Público da Bahia (MP-BA), o relatório foi inconclusivo. Sem a divulgação do nome da vítima, não é possível solicitar aos órgãos públicos o andamento da denúncia.

Dentre as violências contra a população LGBT, as transexuais e travestis são as principais vítimas da violência na Bahia, como pontua o coordenador de Políticas LGBTs da Secretaria de Justiça, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social (SJDHDS), Kaio Macedo.

Os casos de violência contra a população trans são monitorados pela secretaria, por meio da Coordenadoria, que é responsável pelo acompanhamento e construção de políticas públicas para essa população.

Mesmo com essa verificação individual, faltam informações relacionadas aos casos que envolvem pessoas LGBTs, assim como é argumentado pela Antra.

Nos casos de violência contra pessoas trans, o que acontece é que muitas vezes as delegacias registram as ocorrências sem levar em conta a especificação da identidade de gênero das vítimas.

“Cada caso tem a sua especificidade e isso nem sempre está no registro nos boletins de ocorrência, mesmo com um decreto do governador assegurando o direito do nome social na administração pública. Então, depende muito de como essa violação está sendo investigada”.

Com o exemplo da travesti assassinada em Vitória da Conquista, Kaio explica sobre o processo de capacitação dos agentes de força e segurança, para a sinalização correta com respeito à identidade das vítimas, além da instrução do decreto estadual, que assegura o direito ao nome social.

Outro impasse vivido na construção de dados para mapear a realidade da violência contra trans é o receio das vítimas de denunciarem os casos. O medo parte por diversos pontos: as ameaças infringidas pelos agressores; a culpabilização da vítima; o mau tratamento nas delegacias; a falta de assistência jurídica, além da falta de credibilidade da Justiça na resolução dos problemas.

Por Itana Alencar, G1 BA