Por Walmir Rosário*
Nadar, nadar e morrer na praia. Esse é o sentimento generalizado do cacauicultor, em particular, e do agricultor, de maneira geral. No atacado, é quem salva o Brasil no balanço das contas do comércio exterior; no varejo, nem sempre as contas do seu negócio fecham a contento, e a contabilidade consegue ultrapassar o vermelho e chegar ao azul, como é esperado em qualquer negócio, com exceções raríssimas.
Não se trata de simples pessimismo, pois é sabido que para o agro funcionar é preciso que o agricultor consiga superar os problemas que surgem da porteira pra dentro e da porteira pra fora. O que complica é que um sempre depende do outro. Os mais cruciais são as intempéries do tempo e clima, além das doenças e pragas, algumas delas que se apresentam fora de controle, como a vassoura de bruxa no sul da Bahia.
Não sou especialista em economia ou agronomia, mas nos salta aos olhos a derrocada da cacauicultura baiana, na década de 1980, com o ataque da vassoura de bruxa nos cacaueiros baianos. De imediato, causou um estrago sem precedentes na economia regional – dependente da commoditie cacau –, que reduziu a praticamente zero a renda dos produtores e provocou o desemprego em massa dos trabalhadores.
Dentre as teses da chegada do fungo à região cacaueira baiana, pesa a de que teria chegado por mãos de gente interessada em mudar – para baixo – o status político regional, embora esse não seja o tema que nos propomos a debater, e sim a história e as soluções. Para clarear a mente dos leitores, a doença se instalou logo após um período de seca prolongada, quando os cacauicultores já se encontravam descapitalizados.
Além da queda, o coice, como diz o homem do campo, e todos os problemas se agravaram: Sem a produção do cacau, não puderam honrar os compromissos com os agentes financeiros, manter o emprego nas roças. Pior, ainda, foi não ter condições econômicas, financeiras e tecnológica para combater com eficiência a doença, que se alastrou – como rastro de pólvora – por toda uma região.
Diante do estágio alarmante, foi considerada uma epidemia e, por consequência, caberia ao governo federal a implantação de ações políticas para implementar políticas públicas capazes de reverter o terrível quadro. Parecia fácil, pelo fato de a Ceplac ter pesquisado e disponibilizar tecnologia contra a vassoura de bruxa na Amazônia. Só que as diferenças entre a formação da lavoura são abissais.
Enquanto na Amazônia as roças de cacau são formadas em pequeno porte e distantes uma da outra, com regime de chuvas preestabelecidos, na Bahia os limites das roças são as copas dos cacaueiros das fazendas vizinhas e o regime de chuvas de grande pluviosidade o ano inteiro. Somente após muita pesquisa é que a situação começou a se reverter, após a lenta substituição dos cacaueiros decadentes por novos, estes tolerantes ao fungo e de alta produtividade.
Endividado e sem capacidade de contratar novos recursos com os bancos, o cacauicultor viveu uma fase inusitada, na qual contava com tecnologia para formar novas roças, agora com plantas clonadas. Entretanto, não contava com recursos próprios para implementar a mudança e os agentes financeiros também não lhe confiavam crédito para recompor as finanças e pagar as dívidas antigas.
A falta de produção de cacau também trouxe alguns desatinos à economia nacional e pela primeira vez o Brasil começou a importar amêndoas da África, com todos os riscos de trazer doenças e pragas por lá existentes e agravar, sensivelmente, a já combalida lavoura. Com a queda da produção na Bahia – apesar do aumento da produção na Amazônia, especialmente no Pará – a importação do produto se torna uma realidade.
O preço conseguido pelo produtor no mercado atende a expectativa do cacauicultor, desde que consiga mais produtividade com as novas cultivares. Embora descapitalizados e sem crédito, muitos conseguem ultrapassar essas barreiras de fora da porteira e renovam as plantações com os clones tolerantes e de alta produtividade, processo esse que ainda carece de mais intervenção do governo federal, com políticas eficientes.
Diferentemente de outras culturas, o planeta cacau ainda não abriu os olhos para a necessidade de eleger representantes comprometidos com a economia regional, formada com os que têm o visgo do cacau impregnado no corpo e na alma (velho chavão). Por outro lado, os políticos não solucionam esses obstáculos, por saberem que a defesa do cacau dá notícia nos meios de comunicação, mas não garante os votos para a próxima eleição.
E essa individualidade ainda reinante em terras grapiúna deverá será – sempre – um estorvo, um obstáculo a ser vencido. É mais do que necessário que se debatam as propostas e projetos para a “Reativar a Cacauicultura Regional”, de autoria dos engenheiros agrônomos Luiz Ferreira da Silva e José Carlos Castro de Macedo, em segunda edição (2020).
Outra questão primordial é cerrar fileiras na defesa de outro problema – da porteira pra fora – que é a realização de uma transição segura do cabedal de conhecimento existente na Ceplac para outra(s) instituições que deverão assumir o ônus da pesquisa e extensão da cacauicultura. Pode parecer que pouco fará diferença, mas poderá ser uma Torre de Babel dos tempos modernos da cacauicultura.
*Radialista, jornalista e advogado