Por Carlos Brickmann
Uma menina de dez anos de idade que há quatro era estuprada engravidou. A Justiça liberou o aborto, na forma da lei. E que é que aconteceu? A menina de dez anos foi exposta ao público: Sara Geromini, por apelido Sara Winter, em prisão domiciliar com tornozeleira, divulgou nome e dados pessoais da menina, mais o endereço do hospital onde ocorreria o aborto, permitindo que uma turba ululante de fanáticos perturbasse a paz dos pacientes e médicos.
Pior: aos berros, acusaram a menina de “assassina”. O nome do estuprador, ninguém se incomodou em descobrir e revelar. Em que país vivemos, no qual adultos fanatizados gastam seu tempo para insultar crianças e perturbar a vida de um hospital? Pois vivemos num país ainda pior: o presidente da CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, d. Walmor de Oliveira, disse que interromper a gravidez de uma criança de dez anos, vítima de estupro, “é um crime hediondo”.
Sua Eminência Reverendíssima que perdoe este colunista, mas no caso o crime que se configura é atribuir falsamente um crime a alguém. D. Walmor tem todo o direito de, como hierarca católico, condenar o aborto, do ponto de vista de sua religião. Mas qualificá-lo como crime? Crime é algo definido em lei. E a lei não considera crime interromper uma gravidez proveniente de estupro – ainda mais tratando-se de criança, ainda mais após a aprovação da Justiça. Tenho certeza de compartilhar esta posição não só com o Papa Francisco como com o papa emérito Bento 16.
A religião
Apenas relembrando, as três Virtudes Teologais do catolicismo são a Fé, a Esperança e a Caridade – que também pode ser chamada de amor. Palavra de Jesus: “Deixai vir a mim as criancinhas, pois delas é o Reino de Deus”.
A lei
A interrupção da gravidez em casos como este é legal. A Justiça a aprovou – ponto final. Todos têm o direito de defender opinião diferente, por quaisquer motivos, mas sem violência, e sem tentar imputar o crime à vítima. Não como fez Sara Geromini, que expôs a menina. Abusou da prisão domiciliar e se mostrou perigosa, lembra a deputada Perpétua Almeida, do PCdoB, que pediu ao STF que elimine o benefício e a ponha na cadeia.
Abaixo os livros!
Há uns 1.500 anos, quando o califa Omar conquistou o Egito, onde havia a notável Biblioteca de Alexandria, decidiu destruí-la: “Se os livros estiverem de acordo com o Corão, são inúteis. Se estiverem em desacordo, são nocivos”. Os livros foram distribuídos aos balneários, e usados como combustível para aquecer a água. Agora, um milênio e meio depois, o Egito tenta restaurar a Biblioteca de Alexandria, símbolo eterno de sua cultura.
O nazismo lutou contra os livros, os comunistas soviéticos proibiram boa parte dos livros, Mao Tsé-tung fez o que pôde para evitar o contágio de novas ideias. Só eles? Não: Paulo Guedes, o Imposto Ipiranga, também propõe que os livros tenham fim. Em sua reforma tributária, os livros, hoje isentos de impostos, passarão a pagar 12% – o Governo ganhará mais que os autores, mais que os industriais gráficos, mais que os comerciantes, e sem se dar ao trabalho de gerar uma só ideia, um só emprego.
Guedes deveria gostar de livros, já que fez uma boa Universidade americana, a de Chicago, e se gabou de ter lido toda a obra de Keynes no original, e três vezes. Talvez tenha de ler a quarta para ver se entende: tanto Keynes quanto Milton Friedman, guru de Guedes, embora defendam ideias diferentes, são defensores dos livros.
Este conhece
O professor Jayme Pinsky é autor, editor, intelectual de renome. Vejam o que pensa dessa ideia de jerico: http://www.chumbogordo.com.br/33468-o-livro-esse-subversivo-por-jaime-pinsky/
O tempo passa
O ministro da Economia, Paulo Guedes, encaminhou ao Ministério da Saúde, em 21 de abril, um ofício com a lista de 81 imóveis da União, nos 26 Estados e no Distrito Federal, onde poderiam ser instalados hospitais de campanha. O general Eduardo Pazuello, ministro da Saúde, respondeu ao ofício em 31 de julho, três meses depois. Fazendo o cálculo de outro jeito, no dia em que o ofício foi enviado, havia no Brasil 2.700 mortos pela Covid. No dia em que o ofício foi respondido, já havia por aqui 91 mil mortos.
O brasileiro e os impostos
A pesquisa foi encomendada ao Ipespe pela corretora XP. Primeira conclusão: 10% dos entrevistados se julgam bem informados sobre a reforma tributária, 61% mais ou menos bem informados, 26% não estão informados.
A nova CPMF é rejeitada por 78%; mas se for ligada a um programa tipo Bolsa Família, para beneficiar mais pessoas, há empate, 43% a 43%. Se for para substituir outros impostos, 43% concordam e 37% discordam. Mas 59% dos ouvidos dizem não se lembrar de como era cobrada a CPMF. E, para 41%, a alta carga tributária é um dos principais problemas do país.