Por Walmir Rosário*
Vascaíno até a medula, o ex-prefeito de Ilhéus, Newton Lima, não abre mão de suas convicções quando o assunto é o seu time de coração. Esportista de quatro costados, Newton não dispensa uma partida de futebol, que vai desde o simples “baba” até jogos de futebol de quadra, passando pelo futebol de salão. Não importa o motivo do jogo, ele se apresenta para fazer seus gols e jogar conversa fora com uma cervejinha depois do jogo, como sempre fez, desde a juventude.
Como bom vascaíno, Newton Lima detesta os adversários, especialmente os do Rio de Janeiro, velhos conhecidos do Campeonato Carioca, Taça Guanabara, e por que não do Campeonato Brasileiro, onde todos disputam entre si? Mas, um desses times cariocas é o que ele mais detesta: o Flamengo, cuja torcida gosta de tirar sarro dos torcedores adversários, além da algazarra que fazem durante os jogos, barulheira que é ampliada geometricamente quando vencem um jogo.
Mas a rivalidade entre vascaínos e flamenguistas vai além das disputas das partidas e se estende pelo dia a dia, com gozações de ambos os lados. Como dizem que o Flamengo tem uma torcida superior – numericamente – a do Vasco, os cruzmaltinos costumam sofrer com mais intensidade. Pior do que as algazarras durante os jogos, é ouvir dos flamenguistas que o Vasco – orgulho dos “portugueses cariocas” é o campeão entre os vice-campeões do Rio de Janeiro, haja vista o acúmulo de derrotas nas partidas decisivas das várias edições do Campeonato Carioca e da Taça Guanabara.
Pois bem, se a simples gozação nem todos aguentam, imagine passar por outros tipos de constrangimentos. Ainda mais quando o torcedor é político, classe conhecida por tentar agradar – indistintamente – aos pretensos eleitores, seja a que título for. Mas quando o assunto é futebol, a velha rivalidade entre os times do chamado “Clássico dos Milhões” – uma referência à quantidade de torcedores que consegue reunir numa partida –, o “buraco é mais embaixo”, como diria o filósofo carioca “Neném Prancha”.
E entra ano e sai ano, a rivalidade aumenta assustadoramente, principalmente pelas gozações, que vão desde a derrota de uma simples partida com outros adversários, ampliada exponencialmente quando se trata de jogo entre Flamengo e Vasco. E se o assunto chegar ao rebaixamento, aí então é que a briga é na certa, e não tem turma do deixa disso que consiga apaziguar.
Apesar das partidas serem realizadas em local próprio – o estádio de futebol, principalmente o principal reduto carioca: o Maracanã –, as discussões entre as torcidas rivais são realizadas em qualquer lugar. E pra começar o dia, as provocações vêm no transporte coletivo, no local do trabalho, no cafezinho, no bar, entre uma cerveja e outra e até mesmo em locais impensáveis.
Certa feita, ao participar do velório de um grande amigo, Newton Lima – católico fervoroso que é – cantava e rezava com outros presentes, seguido o ritmo do Padre Cristo, que “encomendava” a alma do finado a Deus. Lá pras tantas, não é que o Padre Cristo – que também deve ser flamenguista – puxa o hino do Flamengo, considerando que seria uma última homenagem ao finado, torcedor fanático do time da Gávea.
Enquanto grande parte dos presentes faz coro acompanhando o Padre Cristo, Newton Lima parou – de chofre, como se diz – e ficou quieto. Ao seu lado, o secretário de Governo, Magno Lavigne, flamenguista de quatro costados, a título de gozação, tenta entusiasmar o prefeito a cantar o hino do Flamengo.
– Canta, Newton, canta, todo o mundo está olhando. Lembre-se que é uma última homenagem a um amigo – provocava.
E Newton Lima permanecia calado, sem esboçar qualquer reação, apesar dos constantes apelos do colaborador.
Enquanto não acabou a música, Newton permaneceu impassível. Na saída, não se conteve e disse a Magno Lavigne:
– Ora, Magno, o amigo precisava de oração, o que fizemos, quanto a time de futebol é assunto para os que ficam – e saiu sem falar mais nada.