Manoel Malheiros Tourinho*
Luiz Ferreira da Silva, agrônomo, conhecedor profundo não só dos solos tropicais, mas dos solos amazônicos em especial: como fazê-los produzir sem agredir as suas estruturas físico-químico-biológicas, manejando-os de modo sustentável. Essa afirmação faz sentido porque hoje a moda é conhecer um território, um espaço geográfico com base em interpretações de imagens, uma das causas do insucesso nas atribuições produtivas proclamadas para os solos cultivados na Amazônia. Agrônomos preparados para abrir “trincheiras” não se fazem mais. As imagens substituem as caminhadas, as observações “in situ”, compreendendo-se que abrir uma trincheira para fazer a leitura do perfil do solo é coisa de outros tempos, exatamente daqueles tempos que fizeram da Ceplac a maior organização de desenvolvimento agrário do mundo tropical. Todo o seu corpo técnico – agrônomos, técnicos agrícolas, administradores – eram caminhantes nas estradas, nas escolas agrícolas, nas estações experimentas e centros de pesquisa.
A pessoa que Luiz Ferreira propõe homenagear para perpetuar a sua memória em Rondônia, foi um desses caminhantes. Dar à Estação de Ouro Preto, o nome de Frederico Afonso não será apenas um ato de justiça. Mais que isso, é um ato de amor e reconhecimento a quem dedicou toda uma vida a causas agronômicas do cacau, desde que concluiu o seu curso na antiga, memorável e respeitada Escola Nacional de Agronomia (ENA, RJ) e após fazer breve incursão na Petrobras para ser “modificado” em geólogo de petróleo. Fred não se rendeu aos salários e ao “social status” de um geólogo da Petrobras; ao contrário, rendeu-se à vocação de “homem tatu”, ingressando na Ceplac nos Anos 50, tempos em que, não tendo ainda a sua institucionalidade, todos eram contratados via Instituto de Cacau da Bahia, o velho ICB. Frederico Afonso foi liderança carismática. Ao mesmo tempo em que fazia avançar a tecnologia para recuperação da lavoura de cacau, encetava campanhas para melhoramento dos salários, condições de trabalho, aperfeiçoamento profissional, entre outras.
Como não via a Amazônia apenas como um banco de germoplasma do Theobroma, Frederico Afonso atirou-se de corpo e alma a um projeto de sua concepção: “O Cacau volta às suas Origens”. Amazonense do rio Madeira, nascido em Humaitá, não lhe foi difícil trocar as praias do litoral sul baiano pelas matas da Amazônia e Rondônia. Com a família (esposa e filhos) foi pra Ouro Preto, adentrou na mata e fez do cacau a produção emblemática da colonização do Incra na região.
Ouro Preto tornou-se, com a cacauicultura, um modelo de ocupação da terra cuja vocação agrícola havia sido estudada por Luiz Ferreira e seu time de pedólogos do Cepec. Os estudos determinaram, inclusive, onde assentar a famosa Estação Experimental de Ouro Preto (Eseop) para liderar os estudos agronômicos que a Ceplac conduziria em apoio à vocação natural da Amazônia para o cacau. Os desafios enfrentados pela cacauicultura na Amazônia encantava a plêiade de jovens pesquisadores do Cepec, na Bahia. Pode-se dizer que a Eseop, logo mais Esefa, em justo reconhecimento a Frederico, foi a plataforma de lançamento da cacauicultura a espalhar-se pela Amazônia toda:
Mato Grosso, Goiás, Maranhão, Amazonas, Acre e o Pará, onde vicejou com mais força que em outro lugar, até mesmo de onde veio, a Bahia. Por tudo isso, é merecedor do nosso apoio a proposta-homenagem de Luiz Ferreira a Frederico Afonso. Que a simples Estação venha perpetuar o nome de um colega ímpar, a quem a Amazônia cacauicultora muito deve, mais ainda no Estado do Pará, atualmente o maior produtor nacional da fruta dos deuses.
*Militou na Ceplac entre 1964 e 1989.